8 de maio de 2012

entrevista: conselheira gleyse fala sobre mudanças climáticas.

Fonte: Assessoria de Comunicação do Coep

* Esta entrevista foi publicada no Boletim Informativo Coep, número 1, ano 1, maio de 2012
8 mai 2012 - via @consea




Em pouco mais de duas décadas, as mudanças climáticas deixaram de ser um assunto tratado por alguns iniciados para se tornar tema de políticas públicas. Os fenômenos climáticos extremos que vêm sendo registrados em todo o mundo devem, de acordo com as previsões do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), se tornar cada vez mais comuns.


Esse quadro gera consequências de curto prazo (inundações, deslizamentos, furacões, estiagens) e de longo prazo (deslocamento de populações, comprometimento na produção agrícola, insegurança alimentar; problemas de saúde). As mais afetadas são as pessoas e comunidades das regiões mais pobres, tanto urbanas quanto rurais.


Gleyse Peiter, secretária executiva da Rede Nacional de Mobilização Social (Coep) e integrante do Grupo de Trabalho Mudanças Climáticas, Pobreza e Desigualdades, do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), esclarece conceitos ligados às mudanças climáticas e fala de seus possíveis efeitos e impactos na vida das comunidades de baixa renda.
Representante do Coep no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), ela também detalha estudos e pesquisas sobre adaptação e os impactos humanos das mudanças climáticas.

Mobilizadores Coep - Qual a relação entre mudanças climáticas e pobreza?
Gleyse Peiter - Hoje existe consenso de que as pessoas mais vulneráveis são as mais afetadas pelos impactos das mudanças climáticas. A situação de vulnerabilidade faz com que, a cada evento extremo, essas populações sofram os impactos mais graves. Por exemplo, moradores de um local próximo a um rio que tenha enchentes terão suas casas prejudicadas, estarão sujeitos a mais vetores de doenças, terão dificuldade de locomoção e outras situações.

Quais os principais efeitos das mudanças climáticas sobre as populações de baixa renda?
Os efeitos são diversos, dependendo de cada situação. No caso do aumento de temperatura, por exemplo, os agricultores familiares que têm menos condições do que os grandes produtores terão problemas com suas produções, com mudanças no calendário de colheita e possíveis alterações no modo de produção. Estudos científicos falam que alguns produtos não poderão mais ser produzidos onde eram anteriormente, o que afetaria a cultura de alimentação local, podendo causar estados de insegurança alimentar. Em populações urbanas, as condições de vida ficam prejudicadas em caso de eventos extremos, como perda das moradias, o que coloca as populações em situações de mais vulnerabilidade, ou seja, as condições de vida ficam piores e a cada tempo mais difíceis de recuperação. Se a família perde uma casa para a qual foi feito um empréstimo, a situação financeira da família se agrava, impedindo uma recuperação eficiente.


O que é adaptação aos impactos das mudanças climáticas? Que tipo de ações podem ser consideradas adaptação?
Adaptação significa que os sistemas sociais, econômicos e ambientais de uma determinada região devem ser ajustados de modo a diminuir a vulnerabilidade às mudanças ou variabilidade climática. Adaptação deve ser entendida como uma forma de lidar com as causas do problema e não apenas com as consequências.


E o que significa resiliência quando falamos de comunidades de baixa renda?
O conceito de resiliência trata da capacidade de se recuperar depois de sofrer um impacto. No caso das comunidades pobres, significa poderem estar com seus sistemas sociais, econômicos e ambientais fortalecidos a ponto de permitir uma pronta e efetiva recuperação após um evento climático extremo [enchentes e secas rigorosas, por exemplo].


O que o Coep tem feito na área de mudanças climáticas? Por que o comitê optou por focar esse tema?
O Coep coordena o Grupo de Trabalho Mudanças Climáticas, Pobreza e Desigualdades (GTMC), criado em 2009 no âmbito do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC). O GT apresentou diversos resultados como a elaboração de documentos sobre este tema entregues ao governo brasileiro para as Conferências das Partes (Cop15 e 16); fez um levantamento em mais de 100 comunidades no país, onde o Coep desenvolve projetos, sobre a percepção dos moradores sobre as mudanças climáticas. O Coep também articulou a pesquisa “Mudanças Climáticas, Desigualdades Sociais e Populações Vulneráveis no Brasil: Construindo Capacidades”, que contou com dois subprojetos. O primeiro foi o subprojeto Empresas e envolveu um levantamento sobre as ações sociais de empresas públicas e privadas, associadas ao Coep, relacionadas às mudanças climáticas e às comunidades vulneráveis; o segundo foi o subprojeto Populações Vulneráveis, que envolveu uma pesquisa com diferentes universidades em três biomas brasileiros - Amazônico, Cerrado e Caatinga e duas regiões metropolitanas situadas no bioma Mata Atlântica - sobre a situação das comunidades em relação às mudanças climáticas. Essas pesquisas foram realizadas em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); o Centro de Referência em Segurança Alimentar (Ceresan), da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; o Instituto Virtual de Mudanças Globais (IVIG), o Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); a Oxfam Internacional e a Secretaria Geral da Presidência da República, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Quais as principais conclusões da pesquisa “Mudanças Climáticas, Desigualdades Sociais e Populações Vulneráveis no Brasil: Construindo Capacidades”, coordenada pelo Coep?
Os resultados do levantamento do subprojeto Empresas revelaram o quanto a questão da adaptação ainda é um tema incipiente no universo empresarial, apontando a necessidade de que o assunto se torne objeto de capacitações que possibilitem às empresas desenvolver projetos que contemplem os aspectos sociais e ambientais das mudanças climáticas. De acordo com os dados apurados em campo, as empresas desenvolvem predominantemente ações de mitigação visando reduzir a emissão dos gases que contribuem para o efeito estufa. Já as iniciativas de adaptação das comunidades são menos frequentes e, geralmente, realizadas em conjunto com outras iniciativas. Os resultados indicam também que ainda são pouco praticadas pelas empresas ações relativas à preparação das comunidades para enfrentar os eventos climáticos extremos, citadas por apenas 39% dos entrevistados, e as ações de saúde relacionadas às mudanças climáticas, desenvolvidas por 33% das empresas. Quanto ao subprojeto Populações Vulnerá veis, a pesquisa foi elaborada a partir de uma matriz analítica correlacionando, em cada bioma, os eventos climáticos extremos (temperatura e precipitação) e cinco setores de impactos: agricultura/alimento, água, biodiversidade, saúde humana e condições de moradia. Os resultados apontam para a confirmação de estudos técnicos existentes. No caso da água, as comunidades mencionam a escassez de água para consumo humano e atividade agrícola durante períodos de estiagem periódicos, causando problemas de insegurança alimentar. Em relação à biodiversidade, algumas comunidades já sinalizam para a redução de espécies da flora e fauna local. Quanto à moradia, as comunidades de região metropolitanas mostram que as chuvas intensas, associadas ao movimento das marés provocam alagamentos severos, ocasionando perda ou danos as moradias. Os danos à saúde são visíveis em idosos e crianças pelo aumento da temperatura, com mais doenças e principalmente problemas respiratórios.


O que é o documento “Subsídios ao Plano Nacional de Adaptação aos Impactos Humanos das Mudanças Climáticas”? Como ele foi elaborado?
O documento é resultado da articulação do GT e foi elaborado com a finalidade de propor ao governo federal princípios, objetivos e diretrizes para a elaboração de um Plano Nacional de Adaptação aos impactos humanos resultantes das mudanças climáticas. Este documento foi encaminhado à presidenta da República como contribuição de um grupo formado por representantes de organizações da sociedade civil, movimentos sociais e órgãos de governo. O documento foi elaborado a partir da estruturação de 10 grupos de trabalho temáticos - redução de riscos de desastres; desenvolvimento agrário; desenvolvimento social; educação; saúde; segurança hídrica; meio ambiente; segurança alimentar e nutricional; trabalho e desenvolvimento urbano - que, a partir de um roteiro comum, apresentaram suas propostas, sistematizadas posteriormente pelo Grupo Coordenador do GT (Coep, Fase, Oxfam, Action Aid, Ipea e UFRRJ).

O que precisa ser feito em termos de políticas públicas para fortalecer as populações de baixa renda e torná-las menos vulneráveis às mudanças no clima?
Uma solução é a inclusão, na discussão para elaboração das políticas, das questões associadas aos impactos das mudanças climáticas nas pessoas, ou seja, os impactos humanos das mudanças climáticas podem acontecer de modo transversal, afetando diferentes setores de governo. Por exemplo, ao se discutir o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, a questão das mudanças climáticas deve estar presente, ensejando possíveis medidas para seu tratamento.



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