14 de abril de 2012

Deus e o Diabólico no Dia da Terra que queima debaixo do Sol.

Captura da película Deus e o Diabo na Terra do Sol, 
obra prima de Glauber Rocha, 1964.
Direção de FOTOGRAFIA: Waldemar Lima.
do álbum de Branca Dias

Se diz por aí que o Dia da Terra ou Earth Day é coisa de norte-americano, embora o planeta seja um só. É que a data foi criada pelo senador Gaylord Nelson, em meio a denúncias sobre os efeitos perversos da industrialização nos Estados Unidos.  Mas naquela época, anos 70, nem entre eles o tema meio ambiente era bem vindo. 

A revista Newsweek, por exemplo, chamou o Dia da Terra de tudo e mais um pouco, numa das críticas mais contundentes ao então afluente moderno movimento ambientalista, que surgia em torno do Dia da Terra e da leitura de textos como "Primavera Silenciosa" (Silent Spring).

O tom dado pela revista foi bem diferente daquele com o qual hoje, gentilmente, aborda os assuntos ambientais. Agora, green is in.  No entanto, entre pânico e descaso, mesmo hoje, a questão nem sempre é tratada com a profundidade que demanda para ser compreendida. 

Nesse contexto, é crucial o trabalho realizado online (e offline) por agências de notícias especializadas em meio ambiente, por jornalistas especializados no tema, por seções temáticas nos jornais para acompanhar os momentos históricos quando eles ficam mais "verdes" (como a Folha de São Paulo, que apresentou outro dia o Especial Rio+20), além de  programas temáticos na tevê e no rádio. Uma vez que o assunto não é mais exatamente uma novidade, não se trata, apenas, de passar adiante a notícia, mas qualificá-la, aprofundá-la, para que ganhe sentido na vida de quem lê. É assim, informado, que o "homem diabólico" talvez consiga pensar melhor e, quem sabe, agir melhor na Terra na qual vive, sob um Sol cada vez mais quente. 

Em um artigo sobre a tragédia na escola de Realengo, Leonardo Boff falou de uma doença chamada homemBoff atribuiu à Deus a tarefa de julgar "a subjetividade do assassino":
o ser humano é, ao mesmo tempo, sapiente e demente, anjo e demônio, dia-bólico e sim-bólico. Freud dirá que nele vigoram dois instintos básicos: um de vida que ama e enriquece a vida e outro de morte que busca a destruição e deseja matar. Importa enfatizar: nele coexistem simultaneamente as duas forças. Por isso, nossa existência não é simples mas complexa e dramática. Ora predomina a vontade de viver e então tudo irradia e cresce. Noutro momento, ganha a partida a vontade de matar e então irrompem violências e crimes como aquele que ocorreu recentemente

Se Deus é quem vai julgar o Diabólico Homem e cobrá-lo sobre o que aconteceu em Realengo, se esse é o Seu santo ofício, muito provavelmente também Ele vai ponderar sobre a conduta ecologicamente incorreta da humanidade; questionando seus gestos desde a Revolução Industrial, quando a "Era do Antropoceno" teria começado, com a profunda transformação provocada pela espécie humana no mundo. Citando o Nobel de Química Paul J. Crutzen, que cunhou o termo, Leonardo Boff define esse período como: 
É a idade das grandes dizimações perpetradas pela irracionalidade do ser humano (em grego ántropos). Assim termina tristemente a aventura de 66 milhões de anos de história da Era Cenozóica. Começa o tempo da obscuridade.

Haverá Deus no antropoceno

Será que o Homem Diabólico, Senhor do Antropoceno na Terra que queima debaixo do Sol, ainda que não julgue a si mesmo, pois não é Deus, poderá compreender melhor o quanto sua própria vida depende daquilo que se classifica como não-humano?

O Dia da Terra é dia 22 de abril, Dia do "Descobrimento" do Brasil, cuja história dizimou, dizima e está dizimando paisagens, diversidade, grupos étnicos, apenas um dia depois do aniversário da capital do país, Brasília, a capital dos carros, símbolo da picada aberta no meio do nada, para a suposta vitória do homem sobre a natureza. 

No filme do cineasta Glauber Rocha, "Deus e o Diabo na Terra do Sol", questões ambientais não são protagonistas óbvias, mas estão lá. A morte do gado, a seca, a injusta distribuição dos espaços, o cálculo favorável ao dono na divisão do gado que sobrou da travessia, a exploração do gado como moeda... 


"Mas isso não é a natureza", diz alguém. "Isso é coisa do ser humano"
Mas e não seria Humano-Natureza tudo uma coisa só?

Um toque de natureza deixa o mundo melhor, mas normalmente, quando nós dissemos 'natureza', nós estamos incluindo nós mesmos? - pergunta Raymond Williams. 

A Humanidade inventou a Natureza, o Sol, Deus, a Terra. 
O Dia da Terra, portanto, é o Dia dessa Endiabrada Condição Humana
O Dia da Terra é o Dia de "celebrar a estupidez humana". 
"A estupidez de todas as nações".    

[atualizando um post de 2011 ]



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