22 de abril de 2011

SUPER DEBATE. Deus e o Diabólico no Dia da Terra, que queima debaixo do Sol.

Se diz por aí que o Dia da Terra ou Earth Day é coisa de norte-americano. Bom, o site e a página Earth Day Brasil no Facebook estão em inglês. A data foi criada pelo senador Gaylord Nelson, em meio a um clima quente no debate ambiental e as denúncias sobre os efeitos perversos da industrialização. 

Naquela época, anos 70, a revista Newsweek chamou o Dia da Terra de tudo e mais um pouco. Um tom bem diferente com o qual assuntos ambientais são abordados hoje. Ainda que a imprensa critique, por exemplo, a Earth Hour, há muito mais gentileza.

Se por um lado um certo consenso em torno da pauta green pode ser positivo para manter o assunto em debate na vida cotidiana, é necessário ter em vista que o mundo maravilhoso da informação não chega para todos os bilhões de outros

Ainda que o acesso tenha sido ampliado, em grande parte pela tecnologia da internet, discutir a possibilidade de viver em um planeta mais quente - o que já seria uma realidade - significa discutir e resolver questões sociais - com ênfase ambiental - que não são novas. Como o próprio direito à informação.

Se a crítica da Newsweek ao moderno movimento ambientalista norte-americano, que surgia em torno do Dia da Terra e de textos como Primavera Silenciosa (Silent Spring), nos leva a perceber o quanto a cobertura do tema meio ambiente ainda é, muitas vezes, mais do mesmo, a repercussão das notícias é que se coloca como incrível desafio para os novos tempos. 

O trabalho realizado por agências de notícias alternativas, independentes, patrocinadas ou não - o Brasil tem várias e excelentes agências assim -, é crucial nesse sentido.  Junte-se a isso a possibilidade, que só os tempos globais permitem, de uma pessoa física, leiga e com interesses difusos no assunto, abrir um blog - como esse -, um perfil no twitter, e se tornar fonte, repórter, leitor, ao mesmo tempo.

Leonardo Boff chamou o homem de doença, lembrando a frase de Nietzsche. Logo no começo do artigo, ele sintetiza o que seria a diabólica condição humana:  

o ser humano é, ao mesmo tempo, sapiente e demente, anjo e demônio, dia-bólico e sim-bólico. Freud dirá que nele vigoram dois instintos básicos: um de vida que ama e enriquece a vida e outro de morte que busca a destruição e deseja matar. Importa enfatizar: nele coexistem simultaneamente as duas forças. Por isso, nossa existência não é simples mas complexa e dramática. Ora predomina a vontade de viver e então tudo irradia e cresce. Noutro momento, ganha a partida a vontade de matar e então irrompem violências e crimes como aquele que ocorreu recentemente

A palavra Deus aparece só uma vez e no final do texto, que não é sobre questões ambientais, mas sobre a tragédia de Realengo (sob determinadas perspectivas, algo tão contundente para a vida  na Terra quanto gases de efeito estufa acumulados na atmosfera). Boff atribui à Deus a tarefa de julgar "a subjetividade do assassino". Se Deus é quem vai julgar o Diabólico Homem e cobrá-lo sobre Realengo, se esse é o seu ofício, muito provavelmente também vai ponderar sobre a conduta ecologicamente incorreta da humanidade, pelo menos desde a Revolução Industrial. 

Haverá Deus no antropoceno? Haverá Deus nessa nova era geológica, como diz Leonardo Boff, citando o Nobel de Química Paul J. Crutzen? 

É a idade das grandes dizimações perpetradas pela irracionalidade do ser humano (em grego ántropos). Assim termina tristemente a aventura de 66 milhões de anos de história da Era Cenozóica. Começa o tempo da obscuridade.

Deus não está na imprensa. Mas há muito dele na repercussão das informações. Se o Homem Diabólico, Senhor do antropoceno, souber - ao menos um pouco mais - sobre essa Terra que queima debaixo do Sol, talvez possa - se não julgar a si mesmo, que seria a tarefa Dele - compreender que o planeta não tem dia, não tem hora, e tomar dias e horas que nem hoje - assim com a Hora do Planeta - como um pretexto para "pensar na natureza", na sua própria natureza, na paradoxal impossibilidade de conter e pensar sua natureza (destruidora?), na sua percepção de tudo isso. O Dia da Terra cai no Dia do "Descobrimento" do Brasil, um "fato histórico" que, pela santa graça de diferentes versões, perdeu sua aura de acaso.

No filme de Glauber Rocha, Deus e o Diabo na Terra do Sol, marco do cinema novo, questões ambientais não são protagonistas. No entanto, se não aparecem sob a sua face mais verde, mostram seu rosto mais humano: a morte do gado, a seca, a injusta distribuição da terra, o cálculo favorável ao dono da terra na divisão do gado que sobrou da travessia, a exploração do gado como moeda... Terra, Natureza, Homem, social, ambiental, imprensa, cinema, Estados Unidos, Brasil, senadores, datas alusivas - nada disso se separa, tudo isso é do Homem.

Um toque de natureza deixa o mundo melhor, mas normalmente, quando nós dissemos 'natureza', nós estamos incluindo nós mesmos? - pergunta Raymond Williams. O que você responderia no Dia da Terra? O Dia da Terra é um nome que a deixa distante, longe, e que é sentida assim mesmo por muitos que se dizem filhos dela. 


Feliz Dia do Homem no Dia da Terra.
O Dia da Terra foi o homem que inventou.  
A Terra também -  apesar do juízo e da autonomia de Deus.      


Captura da película Deus e o Diabo na Terra do Sol, 
obra prima de Glauber Rocha, 1964.
Direção de FOTOGRAFIA: Waldemar Lima.

do álbum de Branca Dias


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