28 de fevereiro de 2011

controle de emissões não basta.


POR 

DANIEL SANTINI

EM 28.02.11



Nevoa, poluição e horizonte em São Paulo, foto: Petria Chaves
Acabou de sair o 1º Inventário Nacional de Emissões Atmosféricas por Veículos Automotores Rodoviários. Trata-se de um estudo do Ministério do Meio Ambiente que levou quase dois anos para ficar pronto e que detalha a poluição provocada por motores de carros, caminhões, motos e ônibus de 1980 a 2009. Houve avanços incontestáveis no controle de emissões no período, mas, de acordo com o estudo, as perspectivas para a próxima década são críticas e apontam a necessidade imediata de novas políticas públicas de transporte. Especialistas alertam que mesmo os atuais níveis de poluição causam problemas, cujas principais vítimas são crianças e idosos.
Desde 1986, quando o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) determinou a criação do Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve), um conjunto de ações que vão da determinação de limites de emissões à adoção de combustíveis mais limpos, o nível de concentração de poluentes têm diminuído. “Alguns caem desde a virada da década de 1990, outros a partir do final dos anos 1990”, explica André Luís Ferreira, diretor do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), responsável pelo estudo. Ele alerta que, apesar do avanço, não será mais possível evitar uma crise grave apenas controlando as emissões. “Já estabilizamos e podemos detectar que as emissões voltarão a crescer seguindo o aumento da frota. Apenas controle dos escapamentos não adianta mais”, afirma. “Há um limite para o controle de emissões por veículo e a partir de agora os ganhos serão cada vez mais custosos e menores”.
Transporte individual x transporte coletivo
“Quando se compara o Brasil com outros países da mesma dimensão, como China, Rússia, Índia e Canadá, é fácil constatar que a participação do transporte rodoviário é muito menor do que no Brasil. Temos um transporte excessivamente dependente do rodoviário. Nas estradas e nas cidades”, diz Ferreira. Ele destaca que não tem sentido o Brasil seguir investindo e priorizando o transporte de cargas rodoviário, com caminhões movidos principalmente a diesel, em vez de apostar em alternativas como redes ferroviárias e hidroviárias. O representante do IEMA ressalta que as iniciativas devem deixar de ser exclusivas aos órgãos de defesa do meio ambiente. “O problema deveria ser endereçado também à área de transporte dos municípios, aos órgãos de trânsito. A decisão de se priorizar o transporte motorizado individual não é de quem faz gestão da qualidade do ar”.
Idosos e crianças primeiro
Constatar quão crítica é a situação atual é fácil. Basta escolher um dia seco em São Paulo, qualquer dia, e ir até o Instituto da Criança do Hospital das Clínicas. Passando a recepção, depois de cruzar um piano velho, onde invariavelmente crianças com olhar moleque dedilham notas fora de tom, é só descer um corredor e procurar a sala de inalação para encontrar pelo menos um menino ou menina com a cara enfiada em uma máscara de oxigênio. Mesmo auxiliados por gentis enfermeiras, os pequenos têm o olhar aflito de quem não consegue respirar direito.
Não só em São Paulo, mas em todo Brasil a poluição provocada por veículos automotores já afeta a saúde. “Os mais atingidos são sempre os que estão nos extremos da idade, os mais jovens e os mais velhos. Crianças com doenças respiratórias e idosos são os grupos de risco”, resume o médico Ericson Bagatin, presidente da Comissão de Doenças Respiratórias Ambientais e Ocupacionais da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT). “Com a quantidade de veículos entrando não tem jeito. Mesmo com controle de um lado, com atenção às emissões, escapa do outro, com o aumento da frota”.
Outra preocupação de quem estuda e monitora o assunto é com a tendência a extremos no clima em função do aquecimento global. As variações cada vez mais drásticas são um problema, considerando que quanto mais seco e quente, mais a poluição afeta a saúde e agrava doenças respiratórias. “Em agosto de 2010, após uma semana de 11 dias consecutivos com a umidade relativa do ar baixa, o que é um evento raro, houve aumento de mortes relacionadas a doenças cardiovasculares e respiratórias”, relata Micheline Coelho do Nascimento, colaboradora do Laboratório de Poluição Atmosférica da Universidade de São Paulo. “Estudamos poluição usando variáveis meteorológicas para isolar os dados, mas isso é cada vez mais difícil. Vivemos dias extremos, não dá mais para estudar uma coisa separada da outra”, diz a especialista. “A população não está percebendo isso e a gravidade dessas mudanças. A impressão é que as pessoas estão à parte do clima. Não dá mais para fazer as coisas da mesma forma de antes. O mundo vai parar. Temos que começar a ter uma visão diferente. Na prática não estamos preparados para a revolta da natureza”, conclui.


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