DOMINGO, 15 DE JULHO DE 2012
Para (Muito) Além do Desenvolvimentismo e da Catástrofe
do blog O Descurvo - Por Hugo Albuquerque
A notícia de uma catástrofe |
Não resta dúvida que estamos diante de uma crise ambiental.
Nem que, antes disso, uma crise aguda na coexistência humana
foi instalada pela instalação do capitalismo. A questão não é
que há uma crise ambiental e social, mas há uma grande e
permanente doença instalada que se manifesta de variadas formas,
estourando na forma de crises. A aparente incomunicabilidade
entre um ecologismo radical e um socialismo ortodoxo,
no entanto, sempre escondeu a visão reduzida de ambos
frente a esse estado de coisas.
É essa polêmica que o sempre atento João Telésforo,
no belíssimo post Do ambientalismo catastrofista
a ecologia dos desejos, acendeu. Basicamente,
João passa por questões caras e polêmicas que gravitam
em torno da questão ambiental: crítica ao desenvolvimentismo
e ao catastrofismo, emergência ambiental, relação com a
questão social etc. E foi nessa direção queBruno Cava
completou e avançou no incendiário É preciso consumir mais.
no belíssimo post Do ambientalismo catastrofista
a ecologia dos desejos, acendeu. Basicamente,
João passa por questões caras e polêmicas que gravitam
em torno da questão ambiental: crítica ao desenvolvimentismo
e ao catastrofismo, emergência ambiental, relação com a
questão social etc. E foi nessa direção queBruno Cava
completou e avançou no incendiário É preciso consumir mais.
Pois bem, vamos começar do começo: ninguém
tem dúvidas da gravíssima crise ambiental - muito menos o João,
como ele expõe claramente -, mas eu arrisco em dizer que
o posicionamento em relação ao paradigma da catástrofe -
como prisma para a leitura dessa crise - consiste em
uma divergência válida e importante. Porque isso embica
nas propostas de alternativas para o modelo e qual
a função do negativo nisso tudo. Por exemplo, políticas
dedecrescimento são uma saída?
tem dúvidas da gravíssima crise ambiental - muito menos o João,
como ele expõe claramente -, mas eu arrisco em dizer que
o posicionamento em relação ao paradigma da catástrofe -
como prisma para a leitura dessa crise - consiste em
uma divergência válida e importante. Porque isso embica
nas propostas de alternativas para o modelo e qual
a função do negativo nisso tudo. Por exemplo, políticas
dedecrescimento são uma saída?
Cá, a exemplo do João, concordamos que uma
saída que proponha algo como "desejem menos!"
está fadada ao fracasso - e friso: um fracasso semelhante
ao que experimentou a economia planificada, justamente
por propor isso, concordando com Bruno.
Eis aí a importância de uma ecologia dos desejos.
Curiosamente ou não, ecologistas radicais e socialistas ortodoxos,
apesar de divergirem entre si, se encontram precisamente aí,
na pretensão idealista de busca a resolução pela resignação
em nome de uma necessidade maior e transcendental,
o que passa desde o "faça a sua parte!"
(como o ingênuo fechar as torneiras enquanto se escova os dentes)
até a adoção de políticas restritivas radicais, a partir
das quais não se constrói uma alternativa
nova de produção.
saída que proponha algo como "desejem menos!"
está fadada ao fracasso - e friso: um fracasso semelhante
ao que experimentou a economia planificada, justamente
por propor isso, concordando com Bruno.
Eis aí a importância de uma ecologia dos desejos.
Curiosamente ou não, ecologistas radicais e socialistas ortodoxos,
apesar de divergirem entre si, se encontram precisamente aí,
na pretensão idealista de busca a resolução pela resignação
em nome de uma necessidade maior e transcendental,
o que passa desde o "faça a sua parte!"
(como o ingênuo fechar as torneiras enquanto se escova os dentes)
até a adoção de políticas restritivas radicais, a partir
das quais não se constrói uma alternativa
nova de produção.
Uma dessas políticas restritivas é o descrescimentismo.
Ela está inserida no mesmo binarismo que uma política
crescimentista, mas apenas se reporta ao outro pólo de
forma inversa. É continuar ratificar a mesma métrica
e a mesma gramática do capital, de forma invertida,
enquanto a linha de fuga para tanto está bem além
de uma bifurcação expressa na forma
crescimento-decrescimento, lucro-prejuízo
ou proletarização-desemprego.
Do mesmo modo que a experiência (neo)liberal
dos últimos anos nos ensina que não há
crescimento sem acentuação, de algum modo,
da gestão estatal, também não há decrescimentismo
fora da mesma lógica, só que ela precisaria organizar-se
sintetizando tudo para produzir um desinvestimento
massivo do desejo.
Ela está inserida no mesmo binarismo que uma política
crescimentista, mas apenas se reporta ao outro pólo de
forma inversa. É continuar ratificar a mesma métrica
e a mesma gramática do capital, de forma invertida,
enquanto a linha de fuga para tanto está bem além
de uma bifurcação expressa na forma
crescimento-decrescimento, lucro-prejuízo
ou proletarização-desemprego.
Do mesmo modo que a experiência (neo)liberal
dos últimos anos nos ensina que não há
crescimento sem acentuação, de algum modo,
da gestão estatal, também não há decrescimentismo
fora da mesma lógica, só que ela precisaria organizar-se
sintetizando tudo para produzir um desinvestimento
massivo do desejo.
No que toca ao exemplo do proletarização-desemprego,
é evidente que a conversão de variados setores da multidão
- como índios, mendigos, quilombolas etc -
em uma massa de trabalhadores empregados
não é saída - ao contrário do pretende, por exemplo,
o marxismo uspiano -, mas supor que uma condição
de desemprego massificado não seja um problema
é, certamente, ingênuo: nela, aquelas subjetividades
todas, já convertidas em massa proletária,
estão apenas descartados pelo sistema.
Eles estão inutilizados dentro de um
sistema utilitarista, não libertos dele.
E ainda que o exemplo acima seja de como não se
escapa de um binarismo recorrendo à inversão
de seu pólo, é preciso anotar que decrescimentismo
também não está desvinculado de produção
de desemprego, nem que desemprego
não seja um catástrofe - por vezes desejada
por socialistas ortodoxos dentro do contexto
da crise mundial para, daí, as massas se
conscientizarem à força da necessidade da revolução.
A catástrofe, o limite do mundo (ou do sistema econômico)
aparece como forma de pensar a partir da impotência
e não da potência infinita (portanto, de alternativas sem fim).
é evidente que a conversão de variados setores da multidão
- como índios, mendigos, quilombolas etc -
em uma massa de trabalhadores empregados
não é saída - ao contrário do pretende, por exemplo,
o marxismo uspiano -, mas supor que uma condição
de desemprego massificado não seja um problema
é, certamente, ingênuo: nela, aquelas subjetividades
todas, já convertidas em massa proletária,
estão apenas descartados pelo sistema.
Eles estão inutilizados dentro de um
sistema utilitarista, não libertos dele.
E ainda que o exemplo acima seja de como não se
escapa de um binarismo recorrendo à inversão
de seu pólo, é preciso anotar que decrescimentismo
também não está desvinculado de produção
de desemprego, nem que desemprego
não seja um catástrofe - por vezes desejada
por socialistas ortodoxos dentro do contexto
da crise mundial para, daí, as massas se
conscientizarem à força da necessidade da revolução.
A catástrofe, o limite do mundo (ou do sistema econômico)
aparece como forma de pensar a partir da impotência
e não da potência infinita (portanto, de alternativas sem fim).
Voltemos a crescimento-decrescimento.
A produção está, em qualquer uma
dessas hipóteses, traduzida em uma linguagem
quantitavista. E qualquer uma delas,
a produção precisa estar regulada por um
esquema gestionário que obrigue produzir mais ou menos.
O decrescimentismo, no entanto, é, reiteramos,
uma inversão dentro da mesma racionalidade que
é ratificada e sua aplicabilidade é ela mesma ilusória,
servindo a outro fim na prática de sua aplicação -
seja ele sua inaplicabilidade ou seu aparelhamento com outros fins.
Isso não quer dizer que não haja um problema
de exaurimento dos recursos naturais, nem que
estejamos consumindo demais, mas não é da
resignação do consumo pessoal que iremos nos
libertar do capital, inclusive porque, como
lembram os mestres Deleuze e Guattari
no próprio Anti-Édipo, que estejamos falando
de grandezas iguais quando tratamos de salários e lucros:
"Deveriam [os capitalistas e seus economistas]
antes concluir que o teimam em esconder,
a saber, que o dinheiro que entra no bolso assalariado
não é o mesmo que se inscreve no balanço de uma empresa" (p. 271)
Quando se defende aumento de consumo, estamos
"Deveriam [os capitalistas e seus economistas]
antes concluir que o teimam em esconder,
a saber, que o dinheiro que entra no bolso assalariado
não é o mesmo que se inscreve no balanço de uma empresa" (p. 271)
Quando se defende aumento de consumo, estamos
falando de qual consumo e de como o exaurimento
que isso produz no funcionamento do capitalismo
abre enormes linhas de fugas. Por isso, por óbvio,
o aumento do consumo por parte dos pobres
no Brasil contemporâneo é positivo, uma vez que
reorienta o próprio sentido da produção na direção
das demandas sociais - que, naturalmente,
está aberto a capturas, como qualquer forma de resistência.
que isso produz no funcionamento do capitalismo
abre enormes linhas de fugas. Por isso, por óbvio,
o aumento do consumo por parte dos pobres
no Brasil contemporâneo é positivo, uma vez que
reorienta o próprio sentido da produção na direção
das demandas sociais - que, naturalmente,
está aberto a capturas, como qualquer forma de resistência.
O capitalista, no entanto, sempre está numa posição
complexíssima: deseja os preços salariais menores
possíveis (zero?) e, ao mesmo tempo, precisa de
mercados consumidores (com qual riqueza social?).
Isso explica desde os movimentos imperialistas -
conquista de mercados consumidores - até as constantes
crises no capital - a destruição dos próprios mercados
consumidores para garantir a posse dos meios de produção
ameaçada por trabalhadores financeiramente empoderados
(e o surgimento de uma economia financeira, a nosso ver,
tem mais a ver com a necessidade de acentuação
de controle dos trabalhadores por meio da dívida
que uma nova forma de ganhar dinheiro,
embora também o seja).
Não é, por certo, o crescimento - ou se preferirem,
o desenvolvimento - que alimenta a linha de fuga
do empoderamento multitudinário, mas o
empoderamento salarial dos trabalhadores e,
inclusive, a remuneração não-laboral na forma
de renda como no caso do bolsa família -
seja lá a consequência que isso produza
sobre o crescimento. O problema do desenvolvimentismo
é justamente inverter essa direção, mesmo
que seja para produzir vínculos e relações sociais e,
também, por ignorar estrategicamente a posição
absolutamente insana do capitalista - pretendendo "racionalizar"
o capitalista, lhe ensinando o que é capitalismo,
quando na verdade se expõe à sua sanha de vingança.
O ambientalismo radical ao dizer "consumam menos"
ou "decresçamos" torna-se politicamente impotente,
exceto na condição de discurso útil para ajudar
a justificar políticas de austeridade mais sofisticadas,
os reajustes que capitalistas bancam, de tempos
em tempos, para garantir sua propriedade agora,
quem sabe legitimados pela necessidade salvar a terra
- não pela constituição de novos circuitos produtivos sustentáveis
(portanto, anti-capitalistas), mas sim pela desprodução
(o decrescimento) dentro do próprio âmbito capitalista.
A saída para isso, exige pensar a produção para muito
além da linguagem do capital e seus movimentos
de avanço contínuo (ou recuos estratégicos).
possíveis (zero?) e, ao mesmo tempo, precisa de
mercados consumidores (com qual riqueza social?).
Isso explica desde os movimentos imperialistas -
conquista de mercados consumidores - até as constantes
crises no capital - a destruição dos próprios mercados
consumidores para garantir a posse dos meios de produção
ameaçada por trabalhadores financeiramente empoderados
(e o surgimento de uma economia financeira, a nosso ver,
tem mais a ver com a necessidade de acentuação
de controle dos trabalhadores por meio da dívida
que uma nova forma de ganhar dinheiro,
embora também o seja).
Não é, por certo, o crescimento - ou se preferirem,
o desenvolvimento - que alimenta a linha de fuga
do empoderamento multitudinário, mas o
empoderamento salarial dos trabalhadores e,
inclusive, a remuneração não-laboral na forma
de renda como no caso do bolsa família -
seja lá a consequência que isso produza
sobre o crescimento. O problema do desenvolvimentismo
é justamente inverter essa direção, mesmo
que seja para produzir vínculos e relações sociais e,
também, por ignorar estrategicamente a posição
absolutamente insana do capitalista - pretendendo "racionalizar"
o capitalista, lhe ensinando o que é capitalismo,
quando na verdade se expõe à sua sanha de vingança.
O ambientalismo radical ao dizer "consumam menos"
ou "decresçamos" torna-se politicamente impotente,
exceto na condição de discurso útil para ajudar
a justificar políticas de austeridade mais sofisticadas,
os reajustes que capitalistas bancam, de tempos
em tempos, para garantir sua propriedade agora,
quem sabe legitimados pela necessidade salvar a terra
- não pela constituição de novos circuitos produtivos sustentáveis
(portanto, anti-capitalistas), mas sim pela desprodução
(o decrescimento) dentro do próprio âmbito capitalista.
A saída para isso, exige pensar a produção para muito
além da linguagem do capital e seus movimentos
de avanço contínuo (ou recuos estratégicos).
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