14 de outubro de 2012

~SUPER DEBATE ~ 15 de outubro. Consciência e consumo.



Consciência e consumo.

Josi Paz

Há pelo menos três imagens que me ocorrem com a palavra “consciência”: uma sessão de terapia no divã, trabalhadores numa reunião do sindicato, um confessionário. A expressão “consumidor consciente” tem a ver com todas elas. No entanto, a imagem a qual o termo alude é a do indivíduo comprando. Quem diria que consciência seria associada a um gesto que a crítica remetia à expressão da sua falta: consumir.

Diante do apelo ambientalista ao consumo, o que se diz é que o indivíduo precisa ponderar sobre o que considera necessidade, identificando em que medida a escolha de um determinado produto não é mera resposta ao estímulo da sedução publicitária (cujo poder subliminar é alvo de polêmica).

Também se diz que ceder aos apelos midiáticos e consumistas é pactuar com um estilo de vida (burguês) que só amplia o abismo entre ricos e pobres, exploradores e explorados, fortalecendo um sistema que deve ser combatido, se o que se quer é promover outra relação entre civilização e meio natural.

Ainda: aceitar a volúpia consumista, sem mediações de cunho moral, e gastar sem previsão o que se obteve mediante o dom do trabalho, distanciaria a humanidade da sua promessa divina de bem-aventurança.

Com essas ideias, se afirma que quem compra demais, projeta carências e angústias cujas origens estão bem distantes do shopping. A prática do consumo consciente pressupõe o controle desse impulsos.

Se afirma também que a sociedade de consumidores se apresenta como melhor e única saída possível por que a sua quantidade de coisas já não permite enxergar o horizonte de um outro modo de vida.

Gerar dívidas e desperdício, por sua vez, implicaria gestos individualistas, egoístas, indiferentes. Isso faria com que o pecado do excesso de hoje seja cobrado na tragédia do amanhã.

A expressão “consumidor consciente” dialoga com esses escopos e ganhou mais visibilidade recentemente, em meio às (supostas) incertezas quanto às mudanças climáticas e a escassez de recursos. Quanto mais se põe como “verdade” que o planeta está ficando mais quente e esgotado, mais se impõe aos “consumidores” que sejam “conscientes”.

Essa prescrição parte não só de pesquisadores, do movimento ambientalista e de órgãos internacionais, mas também do setor produtivo e dos governos. No Brasil, desde 2009, o Ministério do Meio Ambiente pontua o dia 15 de outubro como o Dia do Consumidor Consciente.

O dia internacional do consumidor é 15 de março e remonta ao discurso do Presidente Kennedy, que marca o reconhecimento de direitos nos Estados Unidos àquela categoria então emergente, os “consumidores”. Hoje, o termo está na boca de consumidores A, B, C, D, E...

As ações em torno do dia 15 de outubro, porém, têm a ver com a implementação de padrões de produção e consumo sustentáveis. 

Tal foco na política pública ambiental remonta ao Processo de Marrakesh, um dos principais legados do Plano de Johanesburgo, desembocando em novas medidas legais (o Plano Nacional de Produção e Consumo Sustentáveis, por exemplo, aprovado em 2010). Também seria reflexo disso as prioridades no Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, como o destaque à economia verde na Rio+20.

Dia 15 de outubro também é dia do professor. Embora não tenha a ver diretamente com essa data, o dia do consumidor consciente proposto pelo governo federal acaba formando com ela um símbolo forte: são mesmo “novas lições” que se precisa aprender para (con)(sobre)viver sob o efeito estufa.

O Estado acerta ao situar consumo e consciência – matizes diversas - no marco da política pública ambiental. Isso não significa, porém, que o consumo deva ser tomado como seu parâmetro privilegiado. Se existe uma sociedade de consumidores, existe quem esteja fora dela, com urgências ambientais que extrapolam os critérios do código de barras – lucro, projeção corporativa, valor global de mercado.



Josi Paz  - Publicitária, recém-doutora em Sociologia pela UnB, com um estudo sobre consumo e mudança climática.


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